Luto
Todos nós enfrentamos em algum momento algum tipo de crise. A palavra crise na língua chinesa pode significar duas coisas: perigo ou oportunidade. Interessante notar que a mesma palavra tem 2 significados tão diferentes e tão contrastantes.
As perdas em geral como o divórcio, desemprego, migração forçada, morte de um animal de estimação, esterilidade/infertilidade e as perdas envolvidas na recuperação de um câncer, emprego, acidente, problema financeiro, enfermidade podem se caracterizar como crise, entretanto talvez nenhuma outra situação seja tão difícil de enfrentar como a do luto.
O luto designa um afeto doloroso, bem como as suas manifestações externas e de modo geral, é a reação à perda de um ente querido, à perda de alguma abstração que ocupou o lugar de um ente querido, como os pais, a liberdade ou o ideal de alguém, e assim por diante.
A sociedade ocidental em geral tem dificuldade em enfrentar o tema da morte e geralmente procura afastar das vistas tudo aquilo que pode evocar esta questão. É desejável que a morte aconteça o mais distante possível do aconchego do lar, o cuidado do corpo ficou sob responsabilidade dos agentes funerários e a ideia de expor uma criança a um cadáver é inconcebível.
A vivência do processo de Luto foi diretamente atingida por uma atitude de discrição.
Quanto maior o evitamento maior nossa dificuldade em enfrentar e reconhecer que a morte faz parte de um processo natural da vida. Frankl afirma que a tríade dramática humana da qual ninguém escapa é o nascer, sofrer e morrer.
A dor acompanha a morte e o processo de luto desta forma se faz necessário à elaboração de nossas perdas.
Quando a crise se apresenta como perigo?
A crise se apresenta como perigo quando ela possui o individuo, ou quando a dor é tão grande ou a situação em que a pessoa está vivendo é tão intensa que ela perde a visão, a esperança, a fé ou qualquer expectativa mais positiva com relação a vida.
Quando a pessoa é envolvida pela nuvem da depressão ou é tomado pela nuvem da angustia da tristeza e não consegue mais ver nada além do problema, a crise pode então se apresentar como perigo.
Quando a crise se apresenta como oportunidade?
A crise pode ser vivida como oportunidade para o crescimento e para o desenvolvimento da resiliência. Isto não quer dizer que não se sentirá dor ou angustia pela pelas perdas, mas este enfrentamento não paralisará a pessoa.
O sentir faz parte do processo.
O luto é um processo determinado por fatores:
Internos: estrutura psíquica do enlutado, tipo de vínculo com a pessoa falecida e histórico de perdas anteriores e por fatores Externos: circunstâncias da perda, crenças culturais e religiosas e o apoio recebido.
Os teóricos são vários assim como as explicações, entretanto, escolhemos Parkers por maior identificação para explicar as fases do luto.
Fases do Luto:
Choque ou entorpecimento.
A pessoa se sente atordoada ou adormecida.
Reação intensa à perda. Esta oposição pode ser tão intensa, que dá lugar a um desvio da realidade e a um apego ao objeto por intermédio de uma psicose alucinatória carregada de desejo.
Negação.
“Não posso acreditar que seja realidade”, “É como um sonho do qual vou acordar”; “Isto não está acontecendo”. A reação é de incredulidade, incompreensão. Faz-se perguntas do tipo “porque isto aconteceu?” ou “porque eu não evitei isto?”
Procura formas mágicas de manter a pessoa amada consigo. Pensa ver ou ouvir a pessoa perdida. Apenas começa a sentir a realidade do ocorrido.
Sofrimento e desorganização:
Sentimentos como: culpa, depressão, ansiedade, solidão, medo, hostilidade estão presentes.
Pode culpar qualquer um ou qualquer coisa pelo ocorrido, incluindo a si mesma. Pode também apresentar sintomas físicos como dor de cabeça, dor de estômago, cansaço constante e falta de ar. Poderá também afastar-se dos contatos sociais e da sua rotina.
Recuperação e aceitação.
Começa a olhar para o futuro em vez de se concentrar no passado. Ajusta-se à realidade da perda. Desenvolve novos relacionamentos. Desenvolve uma atitude positiva diante da vida.
Mantêm-se o respeito pela realidade e suas ordens são obedecidas pouco a pouco. Há grande dispêndio de tempo e de libido. Nesse meio tempo, prolonga-se psiquicamente a existência do objeto perdido.
É importante que neste processo se reconheça e se autorize o sentir e o experiencializar este momento.
“O que norteia nossa prática é o cuidado para não fazer com que a pessoa pare de sofrer rapidamente, pois isto seria um mecanismo de tamponamento de sua reação, com graves consequências. Assim sendo, cuidamos para não evitar o assunto e não desviar a conversa do tema”.
Sobre o Autor
Abner Morillas
Pastor, psicólogo (CRP 43974-6). Doutor em Psiquiatria (FMUSP). Mestre em Ciências Médicas (FMUSP). Especialista em aconselhamento, professor na Faculdade Teológica Batista de São Paulo.